FOTOAFORISMOS

jueves, 27 de septiembre de 2012

"Diário Anacrônico" - Ficção

 
Hoje, finalmente, sinto-me convalescido após esta primeira intervenção cirúrgica a que me submeti. Talvez já tivesse revigorado as minhas forças há alguns dias passados e apenas meu excesso de cuidado com o corpo me impedía de percebê-lo. Não importa...sinto-me por fim corrigido e descansado deste esforço que toda cura e reabilitação costuma exigir. Sei que hoje são poucos os que escolhem corrigir-se as deficiências. A grande maioria prefere encontrar nas suas limitações novas habilidades e suas múltiplas virtudes imanentes.

foto Lori de Almeida
Sitiado por minha quietude e solidão encontro-me mais a vontade isento de defeitos, que antes sacar proveito das deficiencias e as solicitudes que delas se manifestem. Neste aspecto minha postura é incorrigível. As temporárias cicatrizes que ainda faltam esconder-se baixo à minha pele, proporcionam-me júbilo e orgulho do meu excesso de correção, e  da disposição de espírito que tenho para corrigir a mim mesmo. 
     A autocirurgia ainda persiste em debates bioéticos, mas eu não faço grêmio com nenhuma das coletividades que exigem sua regulamentação. É um alívio quando na autocirurgia tudo se mantém baixo contrôle e chega a bom término. Isto incrementa o orgulho-próprio de qualquer um. Têm muito mérito, é verdade, as instruções e os instrumentos: são eficientes e seguros em geral, mas é difícil estar tranquilo quando não se tem à mão técnica experimentada em práticas cirúrgicas constantes. Eu a pratiquei tão somente porque não gosto de médicos, clínicas e toda esta gente que vê no defeito uma irregularidade da autopercepção. Não possuo tal irregularidade: sei exatamente quais entre meus identificados defeitos sou responsável por dar-lhes vida, tal como decidi ser. E decido eliminar aqueles, entre eles, que tomaram conta de minha vida.

viernes, 21 de septiembre de 2012

Meu juízo de Sócrates...

   A verdade corrompe! E Sócrates o sabia, disso foi acusado e assumiu o veredito lhe imposto. Ele sabia, com grande habilidade de argumentação, convencer a todos e a qualquer de seguir-lhe em lógica e razão - e é bem possível que tenha convencido os próprios juízes que o condenaram. Da defesa de Sócrates sabemos por terceiros (Platão e Xenofonte) de "quê" foi acusado e como defendeu-se e acusou-se a sí mesmo; porém nada sabemos de "como foi acusado".

   A verdade corrompe. Depois de haver aprendido o caminho da verdade, o homem deve decidir agir em consonância, escolhendo com ela enfrentar-se a realidade. Poucos triunfaram com ela, conta a História...a maioría dos homens nela se resigna ou se indigna solitariamente - não conta a História. Se o homem decide não proceder desta maneira é por sua conta e risco. Uma vez que não reclame a verdade das coisas para sí, não terá que enfrentar-se  à escolha. Sim ou não: este é o estado de dúvida que corrompeu o jovem e pelo qual eu acusaría Sócrates. Homens maduros põem sua ética em jogo ao encontrar alguma verdade e assim ajustar sua alma convenientemente à realidade ou corromper-se. E os de débil corpo e de débil espírito, antes de triunfar com a verdade, à outras verdades sucumbirão.




foto  Lori de Almeida - Bruselas.
  
Porque expôr os jovens a tamanho perigo tão prematuramente...??? Porque encontrar-lhes tão cedo o destino de todas as coisas...?

Se o verdadeiro caminho nos faz roçar espinhos...a verdade também gostará de esconder-se debaixo à capas de mentiras e aparências. Muitos gastaram a existencia no labor diário de remover estas capas - e atraentes adereços - sem chegar a deslumbrar  faísca de saber. Sempre em busca do verdadeiro os homens de ciência para cada pequeno tratado de virtude que sacavam a luz, acumularam volumens e catálogos das mais originárias mentiras do espírito humano...

  Porque expôr os jovens a tamanho perigo tão prematuramente...??? Porque encontrar-lhes tão cedo o destino de todas as coisas...? Porque supor-lhes que antes de ser... tudo é falso ser?

Não conseguindo convencer a homens fartos entre comer e beber, preferiu ensinar a juventude...

Te condeno pelos días de hoje Sócrates...Não nos deixaste nenhuma pedagogia que eduque ao adulto.

lunes, 17 de septiembre de 2012

O amante de mulheres tristes

foto  Lori de almeida
Talvez saiba eu, o segredo
Que a sí-mesmo não consiga,
O amante de mulheres tristes,
Esclarecer e revelar.

Ele não chega a notar
Que sua intuição é tão somente
A percepção da debilidade alheia
E os cuidados que lhe urge buscar.

Nem perversidade, nem covardia há,
Quando presta este amante atenção
A um debilitado e outro coração
que fragilizado em sentimentos está.

Uma indevida atração lhe irrompe do espírito à razão / Querá saber onde o medo de sentir / Seu atraente deixou em sí se ocultar / Querá prever quando os traumas / Em seu atraente se irão manifestar / Querá perceber as dores / Aquelas que seu atraente não costuma se queixar.

Uma devida narração - como uma cabida oração -
O amante encontrará em anédotas ligeiras e despretensiosas -
Que tantas outras vidas e livros, particular  impressão sabem dar.
Com elas e sem responsabilidade alguma descreverá
A particular dor com a qual seu atraente se reconciliará
Com o mundo, com o conto, com a fantasia:
Com a triste satisfação de se ter atrevido amar.

Porém não me vejo um aspecto elucidar:
Por que insiste este amante em amar
Uma criatura que do amor
Só guarda o rancor?

Amante de mulheres tristes será...
Ou em estórias lhes gosta recrear?
Ou com triste estória pode ele este amor 
um pessoal sentido lhes inventar?
Ou para ensinar - com cada uma delas -
Com que maneiras costuma o amor
Sua tragédia dentro de cada um encenar?
Se me atrevo com respostas a estas perguntas que traço,
A outra dúvida abro passo:

Um amante, o amigo melancólico será...

Por que à nostalgia sabe convidar
E se propõe a inesperada solidão compartilhar?
E se dispõe, a necessidade de sua ausência, dissimular?

Antes de ir-se embora enumerará este amante
- diante de sua triste atraente - 
Com que descompromissos nos costuma
No meio da estória, o amor, nos abandonar.

sábado, 8 de septiembre de 2012

"O Astigmata" - III

Constatado este novo defeito, a um homem ansioso como eu, se faz necessário explorá-lo com criatividade para não incorrer em vicíos e lamentações indesejados.  Ainda que prescrevam os mais afamados tomos da sabedoria, sem escatimar argumentações, as diferenças entre defeitos/vícios e virtudes/hábitos, é sabido que entre os artistas e os homens santos a fórmula para mapeá-las não deve exigir mais que poucas letras: se o espirito se deforma temos um defeito; se o defeito se espiritualiza temos uma virtude.

foto  Lori de Almeida
Positivamente me instigo a pensar que nisto resida grande parte da riqueza da vida: encontrar-se povoado de defeitos e viver de recriá-los com efeito. Imagino ser esta a riqueza que todos podemos almejar sem medo a pruridos humanistas que possam manifestar-se em nosso íntimo. Livrarmo-nos  da resignação imposta pelas éticas da atualidade, nós que reconhecemos colecionar inevitáveis defeitos. Quanto anonimato nos exige a vida resignada! Fazendo-nos caminhar enfileirados e buscar espírito adentro a identificação "consoladora" com outros - que como você e eu, cobrem os seus defeitos com as mortalhas das "grandes coletividades". 

Quanta serenidade encontraria aquele que pudesse fazer-se virtuoso de suas imperfeições...